quarta-feira, 23 de maio de 2007

Povo inexistente


A democracia se tornou um rótulo politicamente correto no Brasil. A questão é a qual democracia nos referimos. Mas isso é assunto para uma longa conversa. Por ora, registro apenas estranheza com a troca de nome do antigo PFL (Partido da Frente Liberal), formado por dissidentes do PDS, sigla que representou os militares no período ditatorial, por Partido Democrata (PD). Ou "Demo", como tem sido chamado inclusive no meio político do Congresso Nacional.
A propósito do assunto, cito alguns comentários do respeitado professor Fábio Konder Comparato, aposentado da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP). Segundo ele, a "democracia acha-se consagrada entre nós como um "valor universal", mas sem nenhum conteúdo preciso. E este, para o professor, é o lamentável "mal entendido" da atualidade. No meio político, da extrema direita à extrema esquerda, ninguém ousa declarar-se antidemocrático. Como exemplo desse mal-entendido ele cita a troca de nome do PFL. "Ser favorável à democracia nos dias de hoje é uma exigência de etiqueta ou boa educação, tal como quando cumprimentamos alguém, perguntando-lhe "como vai", ou desejando-lhe "bom dia", mas sem nenhum conteúdo preciso."
Um dos advogados de acusação no processo de impeachment do ex-presidente Fernando Collor, e autor de ação contra a privatização da Companhia Vale do Rio Doce, Comparato afirma que o regime político predominante no país foi a oligarquia, salvo "curtos lapsos de ditadura pessoal ou domínio militar". A razão desse vácuo democrático é a mesma do nosso privatismo anti-republicano, disse, onde o povo é politicamente inexistente. "O povo está sempre à margem do cenário, como o carreteiro descalço, que admira da beira de estrada, sem compreender absolutamente nada, a cena heróica do grito do Ipiranga no quadro célebre de Pedro Américo", conclui o professor, uma das referências intelectuais do país.

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